segunda-feira, 31 de outubro de 2011

O Tempo Geológico

INTRODUÇÂO  
O tempo é uma grandeza fundamental da Física, assim como a massa e a distância (o Sistema Internacional define o segundo como unidade de tempo, o kg como unidade de massa e o metro como unidade de distância). É necessário quantificar o tempo para definir o que são processos e mudanças e para que relações de antes e depois possam ser estabelecidas.
               Uma vez que as rochas são registros de processos geológicos é possível determinar processos que ocorreram no passado através do estudo dessas rochas e, assim, entender como era o nosso planeta em tempos anteriores ao surgimento das formas de vida complexa. Diferentes ramos da geologia estudam os processos e respectivos registros geológicos. Por exemplo: a petrologia analisa as rochas e os processos formadores de rocha, a geologia estrutural estuda as estruturas deformacionais e os mecanismos de deformação das rochas, e a paleontologia investiga os fósseis e a evolução da vida. Entretanto, o entendimento da evolução da Terra e do significado de cada um dos processos geológicos nessa evolução só é possível após o estabelecimento das relações temporais entre os registros geológicos. Definir métodos para estabelecer estas relações é, portanto, fundamental na geologia e um dos principais objetivos de todos os geológos, independentemente de sua especialidade.
A Estratigrafia é o ramo das ciências geológicas que investiga a distribuição temporal do registro geológico. De modo geral a estratigrafia dedica-se principalmente ao estudo das rochas estratificadas, i.e. sedimentares. Mas, porque o estudo das rochas enquanto registro do tempo geológico teve início nesse tipo de rocha, a estratigrafia também estuda os diversos métodos datação dos eventos geológicos (neste caso não se restringindo às rochas sedimentares). Além disso, a estratigrafia também é responsável pela normatização da nomenclatura utilizada para designar grupos de rochas.
               Tratando-se de relações temporais duas abordagens podem ser adotadas. Por um lado, pode-se determinar uma sucessão temporal de eventos, sem que se saiba exatamente quando e quanto tempo esses evento levaram para acontecer, estabelecendo assim uma datação relativa de eventos.  Outra alternativa é determinar quando os eventos aconteceram através da obtenção de uma idade absoluta. De modo geral o geólogo trabalha com as duas formas de abordagem do tempo de forma complementar.
               O desenvolvimento dos métodos de datação, entretanto, só foi possível após o entendimento da escala de tempo envolvida nos processos geológico era imensamente diferente da escala humana. O debate acerca da escala do tempo geológico e o desenvolvimento de uma concepção de tempo profundo (longo) perdurou aproximadamente um século, iniciando-se com a formulação da Teoria do Uniformitarismo por James Hutton em 1792. Até então, a noção de tempo dominante era aquela dada pelo estudo criterioso da Bíblia e de outros textos sagrados que estimavam que a Terra teria sido criada em 26 de outubro do ano 4004ac, às nove horas da manhã. As principais teorias que fundamentaram a Estratigrafia moderna foram as do Uniformitarismo, do Catastrofismo e do Atualismo. Essas teorias serão discutidas mais adiante após a apresentação dos métodos de datação relativa.
DATAÇÃO RELATIVA
Os métodos de datação relativa foram os primeiros a serem desenvolvidos, pois não dependiam de desenvolvimento tecnológico e sim do entendimento de processos geológicos básicos e do registro desses processos. Os princípos que permitem a datação relativa são bastante simples e sua aplicação é quase sempre possível em campo quando mais de uma rocha ocorre em um mesmo afloramento. A datação relativa permite estabelecer a sucessão temporal das rochas de uma região, formando uma coluna estratigráfica. As rochas são representadas em uma coluna estratigráfica, de modo que as rochas mais antigas são colocadas na base e as mais jovens no topo. Esta formalidade tem origem em um dos princípios fundamentais da estratigrafia (o da Superposição Vertical das Camadas) que veremos a seguir.

Princípio da Superposição de Camadas (Steno 1669)

               Segundo este princípio em qualquer seqüência acamadada a rocha (camada) mais jovem é aquela que se encontra no topo da seqüência. As camadas inferiores são progressivamente mais antigas. Este princípio pode ser utilizado em depósitos sedimentares formados por acresção vertical, mas não naqueles a acresção é lateral (e.g. terraços fluviais). Outro contexto que não permite a aplicação deste princípio é o de camadas deformadas quando a deformação modifica a posição original das camadas. Neste último caso, entretanto, será possível determinar a idade relativa dos estratos caso a deformação não tenha sido muito intensa e ainda sejam reconhecidas feições indicativas da posição relativa de topo-base e de fósseis-índices nas camadas estudadas. O princípio da superposição das camadas é válido para as rochas sedimentares e vulcânicas (basalto) que se formam por agradação vertical de material, mas não pode ser aplicado a rochas intrusivas e deve ser aplicado com cautela às rochas metamórficas.

Figura 1 – Foto do Grand Canyon com camadas horizontais em sua posição original. As camadas mais antigas são aquelas localizadas na base da seqüência.

Princípio das Relações de Corte (Hutton 1792)

               Segundo o princípio das relações de corte uma rocha ígnea intrusiva ou falha que corte uma seqüência de rochas é mais jovem que as rochas por ela cortadas. Esse princípio permite a datação relativa de eventos em rochas metamórficas, ígneas e sedimentares, sendo fundamental para o trabalho em terrenos orogênicos jovens (cinturões orogênicos) e antigos (escudos). Este princípio é válido para qualquer tipo de rocha cortada por umas das feições acima relacionadas.

Princípio dos Fragmentos Inclusos (Hutton 1792)

                Este princípio de datação relativa diz que os fragmentos de rochas inclusas em corpos ígneos (intrusivos ou não) são mais antigos que as rochas ígneas nas quais estão inclusos. Este princípio, juntamente com o princípio das relações de corte, é fundamental em áreas formadas por grandes corpos intrusivos permitindo a datação relativa não só de rochas estratificadas, mas também de rochas ígneas e metamórficas (se estas ocorrerem como fragmentos inclusos). Muito importante para a datação relativa de terrenos pré-cambrianos. Válido para rochas ígneas e aplicável também a conglomerados. Nas rochas ígneas e conglomerados metamorfizados essa relação pode estar preservada, pemitindo estabelecer as relações temporais entre as rochas originais (hospedeira e fragmento incluso) antes do metamorfismo.

Discordâncias (Hutton 1792)

               As discordâncias são superfícies de erosão ou não deposição, abaixo das quais pode exitir qualquer tipo de rocha, mas acima das quais só podem existir rochas sedimentares. Estas últimas são sempre mais jovens que as rochas abaixo da discordância. Além de permitir a datação relativa de rochas em um afloramento, a presença de uma discordância indica que houve erosão de parte do registro geológico naquele local. Assim, as discordâncias constituem uma prova indiscutível de que o registro geológico não é completo.
               Dependendo do tipo de rocha, da posição das estruturas sedimentares abaixo da discordância e da geometria da superfície de discordância estas podem ser classificadas em: (i) discordância paralela (paraconformidade); (ii) discordância angular ou (iii) inconformidade (“litológica”).
 Figura 2 - Siccar Point. Discordância angular reconhecida por Hutton para ilustrar o conceito proposto por ele.


Figura 3 – Esquema ilustrando vários principíos de datação relativa. O granito corta as camadas da seqüência sedimentar localizada abaixo da discordância angular e contém xenólitos dessa seqüência. Essas relações indicam que as rochas sedimentares localizadas abaixo da discordância são as mais antigas. Acima da discordância encontram-se as rochas sedimentares mais jovens. Note que essas rochas contem clastos (pebbles) do granito.

Princípio da Sucessão Faunística (Smith 1793)

               Antes de Charles Darwin começar sua viagem histórica com o Beagle (1832), quando coletaria o material para escrever seu famoso livro “Origem das Espécies”, a existência de antigos sinais de vida nas rochas já era conhecida. Embora os fósseis fossem reconhecidos desde a Grécia Antiga, por muito tempo foram interpretados como “brincadeiras da natureza” até o Resnacimento, quando Leonardo da Vinci as interpretou como formas de vidas passadas. Willian Smith, um engenheiro britânico, foi o primeiro a reconhecer que o conteúdo fossilífero de camadas, por vezes de mesmo tipo de rocha, variava sistematicamente das mais antigas para as mais jovens. O mesmo fato foi logo verificado em outras partes do mundo, e o Princípo da Sucessão Faunística passou a ser aplicado à datação relativa e correlação estratigráfica (ver abaixo) de rochas sedimentares.
               O Princípio da Sucessão Faunística diz que os grupos de fósseis (animal ou vegetal) ocorrem no registro geológico segundo uma ordem determinada e invariável, de modo que, se esta ordem é conhecida, é possível determinar a idade relativa entre camadas a partir de seu conteúdo fossilífero. Ou seja, pode-se dizer que fóssil = tempo. Esse princípio, inicialmente utilizado como um instrumento prático, foi posteriormente explicado pela Teoria da Evolução de Darwin: uma vez que existe uma evolução biológica irreversível através dos tempos geológicos, os fósseis devem se ordenar no tempo segundo uma escala evolucionária. Diversos períodos marcados por extinção de grande parte do conteúdo fossilífero são conhecidos na história da Terra e levaram ao desevolvimento da Teoria do Catastrofismo (Cuvier 1796).


Figura 4 - Ilustração de Cuvier exemplificando o Princípio da Sucessão Faunística.

CONCEITOS FUNDAMENTAIS PARA APLICAÇÃO DOS FÓSSEIS NA DATAÇÃO
Fóssil: todo e qualquer vestígio de atividade biológica registrada nas rochas (e.g. conchas, ossos,  buracos de vermes, etc).
Fóssil-índice: correponde a um organismo que viveu por um período de tempo geologicamente curto, mas que ocupou um grande espaço geográfico. Normalmente são animais marinhos, e.g. Grupo das Trilobitas (foto abaixo), típico do Perído Cambriano (570-505 Ma).
 
Figura 5 – Foto de Trilobita. Fóssil-guia do Período Cambriano.
Associação Faunística. um conjunto de fósseis, que embora isoladamente não tão restritos a um intervalo de tempo, em conjunto caracterizam um intervalo de tempo específico.

Correlação

               Em cada afloramento encontra-se apenas uma parte da história geológica de uma região. Para se determinar a história completa de toda a região e até do continente e da Terra é necessário “somar” os fragmentos da história geológica de vários locais. Uma vez determinadas as idades relativas entre as rochas de um afloramento, construindo assim uma coluna estratigráfica local, tenta-se correlacionar essa coluna à de outros pontos de modo a abranger um intervalo de tempo maior “empilhando” o registro geológico de todos os afloramentos.
               Correlacionar, no sentido estratigráfico da palavra é reconhecer igualdade entre pacotes de rochas separados no espaço, tanto quanto ao aspecto litológico quanto ao aspecto temporal. A correlação estratigráfica, portanto, pode basear-se em características litológicas ou em relações temporais das rochas. O objetivo da correlação é reconhecer pacotes de rochas, pertencentes a um só corpo e desenvolvidas em um mesmo intervalo de tempo, em condições similares, e que partilharam de uma história comum. Os principais métodos de correlação estratigráfica são: o da continuidade física, o das caracteríticas distintivas, o da posição estratigráfica e os biológicos. Esses métodos são empregados principalmente no estudo de unidades litoestratigráficas. Embora os três primeiros métodos também sejam aplicáveis, de certa forma, às rochas intrusivas e metamórficas, o principal método de correlação neste caso envolve datação radiométrica, que será visto mais adiante.

Continuidade física

               É o método de correlação que se baseia na existência de camadas cuja continuidade pode ser observada. Este método, embora muito seguro é limitado espacialmente e por condições ideais de afloramento (e.g. Grand Canyon) tais como: vegetação esparsa, solos pouco desenvolvidos terreno com ausência de pertubação estrutural.

Características litológicas distintivas

               Considera as semelhanças litológicas entre corpos isolados tais como: composição mineral, textura, estruturas primárias, espessura, etc. Dois problemas devem ser considerados nessa metodologia:
*             a possibilidade de convergência litológica através dos tempos. Isto porque os processos formadores de rochas repetem-se no tempo, podendo gerar rochas semelhantes com idades muito distintas;
*             a existência de variação espacial nos ambientes sedimentares, originando diferentes tipos de rochas no mesmo intervalo de tempo. Neste caso, o trabalho de correlação requer o reconhecimento das variações laterais existentes no campo para que a correlação possa ser corretamente estabelecida.

 Posição estratigráfica

               É comum reconhecer-se em um afloramento mais de uma camada de uma mesma rocha. Como correlacionar estas camadas a uma única camada, da mesma litologia (ex. calcário) observada em outra região? Uma característica importante a ser considerada é a posição relativa dessas camadas em relação a outras rochas associadas espacialmente. Estão elas no topo da unidade litoestratigráfica, ou na porção basal? Estão abaixo ou acima de uma determinada camada facilmente reconhecida e correlacionável nos dois locais? Neste caso o conceito de camada-guia é fundamental.
Camada-guia: é uma camada com características particulares e com grande expressão regional o que permite reconhecê-la em diversas regiões distantes. De grande auxílio  para a correlação estratigráfica com base na posição das demais camadas em relação a ela.

Métodos biológicos

               Esses métodos baseiam-se essencialmente no Princípio da Sucessão Faunística, descrito acima, que permite que camadas que afloram a longa distância sejam correlacionadas por seu conteúdo fossilífero. O maior problema na utilização de fósseis na correlação estratigráfica está na possibilidade desses fósseis trascenderem, ainda que localizadamente, o intervalo de tempo a que são normalmente atribuídos. Além disso, existe um forte controle ecológico sobre o desenvolvimento das espécies animais e vegetais (ex. ambiente lacustre x ambiente marinho), além do controle da seleção natural. Assim, rochas de mesma idade podem apresentar associações fossilíferas bem distintas.
               Essencialmente a correlação estratigráfica com este método baseia-se na presença de fósseis-índice  e de associações fossilíferas.

Introdução

" Por volta de 1540 o arcebispo Ussher estabeleceu uma cronologia "geológica", segundo a qual a Terra teria sido criada a 26 de outubro do ano 4004ac, às nove horas da manhã!" (Allégre, 1987)
               Embora já no século XIX existisse um conhecimento geral das colunas estratigráficas da Inglaterra e França, não se sabia ao certo quanto tempo estava envolvido na formação desses empilhamentos. Sabia-se, sim, que a espessura dos "terrenos estratigráficos" refletia um determinado intervalo de tempo. Com o acúmulo de dados verificou-se que havia terrenos que apresentavam características similares. Portanto, estes terrenos podiam ser correlacionados e, com base nos métodos de datação relativa, ser empilhados, formando uma coluna estratigráfica geral: a Escala Geológica do Tempo. Com o passar do tempo (humano) começou a fazer-se sentir a necessidade de calibrar a escala geológica em unidade de tempo. Para isso era necessário desenvolver métodos de datação absoluta.
               Os primeiros métodos de datação baseavam-se na observação de processos geológicos e suas taxas. Assim, através do registro geológico seria possível estimar o tempo envolvido na formação de um determinado volume de rochas. Seguindo um método desse tipo Charles Darwin afirmou que seriam precisos 300 Ma para escavar o vale de Wealden, SE da Inglaterra. Já J. Joly calculou a "idade dos oceanos", comparando a salinidade dos oceanos com a quantidade de sais trazida pelos rios e afluentes, obteve uma idade de quase 100 Ma para o mesmo e para a Terra. Lord Kelvin, defensor da cronologia curta, amparado em cálculos de resfriamento da Terra, estimou da mesma forma idades inferiores a 100 Ma.
               Em contrapartida, geólogos como Hutton e Lyell defendiam que o tempo geológico era profundo, muito superior ao que a humanidade era capaz de compreender. Essa idéia está bem expressa nas afirmações de Hutton de 1788 (Gould 1987):
"O tempo, que é a medida de todas as coisas em nossa idéia e costuma ser deficiente para nossos projetos, é infindo na natureza e como que nulo."
" Se a sucessão de mundos está determinada no sistema da natureza, é vão buscar algo superior na origem da Terra. O resultado, portanto, da nossa investigação é que não encontramos nenhum vestígio de um princípio - nenhuma perspectiva de um fim."
               Essas duas idéias de uma cronologia relativamente curta (100 Ma) e de uma cronologia extremamente longa, tanto que não tinha nem princípio nem fim, deu origem a duas correntes do pensamento geológico que dominaram por muito tempo: o catastrofismo (Seta do Tempo Curta) e do Uniformitarismo (Ciclo do Tempo Longo).
               A progressão do conhecimento sobre os processos geológicos (salinidade do mar constante, produção de calor por decaimento radioativo) e o surgimento de novas tecnologias (métodos de datação radiométricos) mostraram que Hutton tinha razão, ao menos com que diz respeito à dimensão do tempo geológico (c.a. 4,6 Ga). A Teoria do Uniformitarismo, entretanto, não é plenamente correta: o tempo geológico é longo sim, mas não é infinito ou cíclico, e a história do planeta foi marcada por diversos eventos catastróficos. A nossa Terra teve um começo e um dia terá um fim. Mas a idéia principal da Teoria do Uniformitarismo, de que apenas processos que podemos entender e observar são considerados para interpretar o registro geológico (Atualismo) continua sendo um dos p

rincípios fundamentais da geologia.

Princípios da datação absoluta – métodos radioamétricos

               O descobrimento da radioatividade em 1896 por Becquerel tornou-se o principal instrumento na comprovação do tempo geológico longo. Os métodos de datação radiométrica, entretanto, só foram completamente desenvolvidos e amplamente aplicados a partir dos anos 50, quando a radioatividade se tornou mais completamente entendida e os equipamentos necessários (i.e. espectrometro de massa) para a sua aplicação na datação fossem desenvolvidos.
               A determinação da idade da Terra esbarra em dois problemas principais. Em primeiro lugar é necessário ter um método capaz de avaliar uma dimensão de tempo tão vasta quanto do tempo geológico. Esse problema foi resolvido com o advento dos métodos de datação radiométrica utilizando elementos com meia-vida longa. O outro ponto, de mais difícil solução, é a escolha do material a ser utilizado para a datação. Depois de sua formação a Terra sofreu intensa diferenciação que resditribuiu os elementos químicos e moficou as concentrações pai-filho originais.
               Após serem desenvolvidos os métodos de datação radiométrica, o passo seguinte dos geocronólogos foi o de tentar datar a idade da Terra. Essa nova jornada, entretanto, mostrou-se mais complexa que originalmente imaginado. Diversas rochas consideradas muito antigas foram datadas, mas o resultado revelou-se decepcionante. As idades mais antigas inicialmente encontradas foram de apenas 2 – 2,7 Ga (as idades mais antigas encontradas até hoje são de ± 4 Ga).
               Reconhecendo a dificuldade de achar na Terra um material original, Patterson (1950) resolveu analisar rochas extraterrestres para obter a idade da Terra, i.e. a idade de formação dos planetas do sistema solar. Aplicando o método de datação U/Pb em condritos, Patterson obteve a idade de 4,55 Ga para a formação da Terra. Essa abordagem é procedente já que os condritos representam fragmentos de planetesimais não diferenciados (ver Dados Físicos da Terra) e, portanto, correspondem aos materiais mais primitivos do Sistema Solar.
               Tentando obter essa mesma idade em materiais terrestres, Patterson utilizou meteoritos sem traços de U, mas com Pb, para determinar a composição isotópica original do Pb quando na formação do sistema solar e planitesimais. Conhecendo a proporção de Pb original Patterson era capaz de descontar a quantidade original elementos-filhos de Pb dos sistemas químicos terrestres. Mas o que datar?  Procurando encontrar sistemas químicos que representassem a média composicional da crosta e manto terrestre, Patterson analisou nódulos manganês nos sedimentos marinhos (média da crosta) e basaltos do Havai (média do manto), descontou o valor de Pb orginal e obteve a idade de 4,55 Ga. Desde então esta é considerada a idade da Terra.
               Apesar da engenhosidade da abordagem de Patterson, a idade obtida para os materias terrestres corresponde à idade de formação do núcleo, manto e crosta, i.e. é uma idade mínima para a Terra (Ozima 1989). De fato, a datação da idade de formação da Terra não pode ser obtida a partir de nenhum material terrestre, já que a Terra sofreu diferenciação após a sua formação. Assim, os resultados obtidos a partir de materiais terrestres podem ser considerados apenas como idade mínima para a origem do planeta, muito embora sejam de extrema importância para entender sua evolução através dos tempos. A idade da Terra de fato só pode ser obtida através de métodos indiretos, como o da datação dos meteoritos.
               O que pensaria uma borboleta que possue uma vida de apenas um dia sobre uma sequoia que perdura por milhares de anos? Provavelmente acreditaria que a sequoia esteve sempre ali, imutável, estática e sem vida. Já um outro observador, de vida mais longa, poderia acompanhar diversas etapas da vida da sequoia, ver seu nascimento e seu crescimento, apenas porque vive em uma escala de tempo mais compatível com as taxas dos processos vitais dessa árvore. Nós humanos estamos para a Terra assim como a borboleta está para a sequoia. Ou seja, de modo geral não somos capazes de abstrair o significado da escala de tempo dos processos geológicos. O intervalo de tempo que compreende toda a história da Terra, desde sua formação até o período atual, é o que denominamos de Tempo Geológico. Ou seja, o Tempo Geológico corresponde aos 4,6 bilhões de anos da Terra.
               Será que você é capaz de imaginar o que significa todo ese intervalo de tempo? Provavelmente não. Para melhor compreender essa escala de tempo nos podemos fazer uma pequena simulação:
"Imagine que os 4,5 bilhões de anos da Terra foram comprimidos em um só ano (entre parênteses colocamos a idade real de cada evento). Nesta escala de tempo, as rochas mais antigas que se conhece (~3,6 bilhões de anos) teriam surgido apenas em março. Os primeiros seres vivos (~3,4 bilhões de anos) apareceram nos mares em maio. As plantas e os animais terrestres surgiram no final de novembro (a menos de 400 milhões de anos). Os dinossauros dominaram os continentes e os mares nos meados de dezembro, mas desapareceram no dia 26 (de 190 a 65 milhões de anos), mais ou menos a mesma época em que as montanhas rochosas começaram a se elevar. Os humanóides apareceram em algum momento da noite de 31 de dezembro (a aproximadamente 11 milhões de anos). Roma governou o mundo durante 5 segundos, das 23h:59m:45s até 23h:59:50s. Colombo descobriu a América (1492) 3 segundos antes da meia noite, e a geologia nasceu com as escritos de James Hutton (1795), Pai da Geologia Moderna, há pouco mais que 1 segundo antes do final desse movimentado ano dos anos." (extraído de Eicher, 1968)
               O tempo geológico está dividido em intervalos que possuem um significado em termos de evolução da Terra. A escala do tempo geológico, cujo esqueleto rudimentar foi estabelecido ainda no século XIX , está dividida em graus hierárquicos cada vez menores da seguinte forma:
*             Éons (Hadeano, Arqueano, Proterozóico e Fanerozóico);
*             Eras (apenas no Éon Fanerozóico: Paleozóica, Mesozóica e Cenozóica);
*             Períodos (para cada uma das eras do Fanerozóico);
*             Épocas (subdivisões existentes apenas para os períodos do Cenozóico).

Figura 12 – Escala do Tempo Geológico com alguns eventos geológicos importantes assinalados.

               Essas subdivisões foram estabelecidas ainda antes do desenvolvimento dos métodos de datação absoluta. As subdivisões de tempo definidas, portanto, não representam intervalos de tempo equivalentes, mas refletem a possibilidade de desvendar os detalhes da evolução geológica em todos os tempos. O registro geológico mais recente é mais completo e apresenta maior número de fósseis, permitindo delimitar intervalos temporais menores. O registro da evolução geológica antiga é muito mais fragmentado e com a ausência de fósseis possibilita apenas a delimitação de intervalos de tempo maiores, marcados por grandes eventos globais.

Figura 13 – A história geológica da Terra é atualmente descrita por uma espiral temporal indicando que processos atuais ocorreram no passado (Uniformitarismo), mas não da mesma forma, com mesma intensidade e não necessariamente todos os processos do passado ocorrem no presente e vice-versa.
Que tal fazer outra comparação? Experimente comprimir a idade da Terra a 100 metros. Qual seria o comprimento de cada éon, era e período da escala do tempo geológico?

Trabalho de Casa: Faça sua escala do tempo geológico com as principais subdivisões e seus respectivos intervalos temporais.

Allegrè, C.1987. Da Pedra à Estrela. Edições Dom Quixote, Lisboa. 261pp. Capítulo III – O Calendário Geológico (complementar)
Eicher, D.L. 1969. Tempo Geológico. Ed. Edgar Blücher Ltda., São Paulo. 172pp. Cap. 1 – Evolução dos Conceitos. (complementar)
Hamblin, W.K. & Christiansen, E.H. 1995. Earth’s Dynamic Systems. Prentice Hall, London. 7a ed. 710pp. Cap. Geologic Time (BÁSICA)
Ozima, M. 1989. Geo-história - a evolução global da Terra. Editora UnB, Brasília. 166pp. Cap.2.3 – Lua, meteoritos e outros planetas: A chave para a compreensão da história primitiva da Terra. (complementar)
TEIXEIRA, W.; de TOLEDO, M.C.M.; FAIRCHILD, T.R. & TAIOLI, F. (org.) 2000. Decifrando a Terra. Oficina de Textos, São Paulo. 568pp. (BÁSICA)

Nota para os internautas: Visite o site da United States Geologic Survey (USGS) sobre o Tempo Geológico (http://pubs.usgs.gov/gip/geotime) e aproveite para espiar os links para outros temas (vulcões, terremotos, minerais, etc). Boa viagem!!!

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Principais Teorias de Formação da Terra


Teoria da projeção
Teoria de Buffon: Um cometa teria se chocado com o Sol, causando a projeção de fragmentos incandescentes no espaço, originando assim os planetas, que mantiveram o movimento no sentido do choque primitivo, no plano da eclíptica. Com o resfriamento contínuo a Terra acabaria por congelar-se totalmente dentro de 93.000 anos.

Com a descoberta de que os cometas são formados de matéria gasosa, sendo inviável que seu choque pudesse causar deslocamento de matéria solar, foi abandonada a teoria de Buffon, tanto mais que seu cálculo de tempo para congelamento da Terra não levou em consideração a ação dos raios solares, somente o calor central. "Para que a Terra se tornasse inabitável pelo resfriamento, fora necessária a extinção do Sol". Por outro lado, aceita-se atualmente que o Sol, em vez de massa incandescente, seja formado por matéria sólida cercada por uma fotosfera.

Teoria da condensação

É a que prevalece na Ciência: a Terra seria originária da condensação da matéria cósmica, inicialmente incandescente, formando após uma crosta sólida pelo resfriamento. Tal teoria coincide com a exposta no Capítulo VI: Uranografia geral.

Teoria da incrustação

Segundo essa teoria, de Miguel de Figagnères, com poucos adeptos, a Terra teria uma alma que provocara a junção de quatro astros que com isto concordaram, visto terem livre-arbítrio, mediante soldadura, mantendo-se, durante a operação, todos os seres que os habitavam em estado cataléptico. Tal Teoria contradiz os dados da ciência experimental, não havendo quaisquer vestígios das soldaduras, como também de geologias particulares aos astros componentes da nova Terra. Além do mais não explica a origem dos planetas incrustados.

Alma da Terra
A idéia de que a Terra teria uma alma inteligente não pode prosperar, pois, não tendo nosso globo sequer a vitalidade de uma planta, não poderia abrigar um espírito superior.

Por alma da terra pode-se racionalmente designar o "Espírito a quem está confiada a alta direção dos destinos morais e do progresso de seus habitantes, missão que somente pode ser atribuída a um ser eminentemente superior em saber e em sabedoria".